quarta-feira, 11 de julho de 2007

Modelo Reduzido

Há alguns meses, construi um modelo reduzido em madeira de balsa e fita-crepe que foi fotografado em todas as fases de montagem e mostrado ao vivo a algumas pessoas que acompanham esta saga. O modelo reduzido, para fazer juz ao nome, foi literalmente reduzido a frangalhos pela sanha destruidora dos operários que fizeram a pintura do meu apartamento (veja foto).



Nem me preocupei com este acidente, confiante no fato de que as fotos estariam convenientemente guardadas, até procurá-las e concluir que haviam sido formatadas juntamente com o cartão de memória da câmera digital. Recuperei o cadáver do modelo e o reconstituí, refazendo as peças destruídas ou desaparecidas.

Felizmente, as notas que havia tomado na montagem original haviam sido diligentemente protegidas do desaparecimento pela minha empregada que as colocou numa pasta que só ela sabia onde estava. A segunda montagem resultou na confirmação de alguns pontos e na observação de outros problemas não anotados na primeira montagem. Nada como uma catástrofe para acrescentar conhecimento.

Na foto abaixo estão todas as peças do modelo para ser usado a remo, exceto o fundo. Para velejar, além do mastro, retranca e carangueja, serão necessários leme, cana do leme e bolina.



Na foto fora de foco a seguir se vê a antepara do banco que serve de suporte a ele e de travamento principal do casco com as anteparas longitudinais. Durante a primeira montagem se constatou a necessidade de se fazer um encaixe do tipo meio-corte entre esta antepara e cada uma das anteparas longitudinais. Por ocasião da segunda montagem, durante o ajuste das peças, houve a quebra das duas partes que servem de diafragmas para as vigas caixão longitudinais. Na foto pode-se notar que foi necessário um reforço sobreposto. A fragilidade se deve ao entalhe e ao direcionamento das fibras horizontalmente (o reforço tem as fibras na direção vertical).

No barco definitivo pode ser adotada a solução de recortar a peça da antepara do banco de forma a ter a fibra orientada na vertical ou dividí-la em 3 peças, mantendo a continuidade das anteparas longitudinais, sem o encaixe tipo meio-corte. A desvantagem desta solução parece ser perder a utilidade da antepara do banco como molde para a montagem do casco.



Início do fechamento do casco com a proa e a antepara transversal de proa já instaladas.

Colocação da antepara do banco. Foi usado um laço espanhol de fita crepe para aproximar os costados da antepara.

Casco já fechado com a instalação do espelho de popa, aguardando o fundo.

Fundo colocado no lugar. O suporte do mastro, que havia sido colado na primeira montagem, não foi retirado. A caneta estão marcadas as interseções das anteparas longitudinais com as transversais e a posição dos diafragmas que serão instalados no interior das vigas caixão (dois em cada uma). Também se vê a marca da posição da caixa da bolina.

Instaladas as anteparas longitudinais com respectivos diafragmas. A idéia é preenchê-los com garrafas pet lacradas, de modo a preservar a flutuabilidade positiva mesmo em caso de ruptura acidental do casco. Só o compartimento frontal seria usado como depósito, instalando-se uma tampa de visita estanque no convés ou na antepara transversal (com acesso prejudicado parcialmente pelo mastro).

Vista inferior do casco, onde se pode notar a grande fresta entre o fundo e o costado que não havia na primeira montagem e que lembra a necessidade de só cortar o fundo depois de sua colocação no local definitivo. Outra constatação é a necessidade de fixação de ripas no costado para dar apoio ao fundo e criar uma superfície adequada para colagem.



Na foto abaixo nota-se a deformação da antepara transversal em consequencia da antepara longitudinal cortada com comprimento maior do que devia, provavelmente por não ter sido levada em consideração a espessura da madeira da antepara transversal. Veja-se também a quantidade exagerada de cola gasta na fixação do diafragma na abcissa +45. Na instalação da antepara longitudinal, a tendência neste ponto é de afastamento entre a antepara e o costado. Aparentemente ela trabalha tracionada horizontalmente.



Na foto a seguir, foi instalada a caixa de bolina, composta de duas laterais, a face frontal que serve de enrijecedor e a face superior. A face posterior é a antepara do banco. A face superior era inicialmente a continuação do banco mas ficava frágil com as fibras dispostas tranversalmente ao barco. Então optou-se pela construção em duas peças sobrepostas, com as fibras de cada uma orientadas na direção de sua maior dimensão.

Na foto abaixo já estão instalados o banco e o convés frontal.

Aqui estão colocados em posição a bolina e o leme com sua cana. As espessuras destas peças estão desproporcionais às medidas lineares do modelo. As vigas-caixão foram cobertas com plástico transparente para permitir a observação da estrutura de travejamento interna. O convés frontal deverá receber peças de madeira de reforço em torno da abertura do mastro. Possivelmente também será necessário incluir um quebra-ondas à frente do mastro que pode ser uma fixação conveniente para moitões ou cunhos para a adriça e o burro.



Vista posterior do barco na empopada, com a vela totalmente aberta. Mastro, vela carangueja e retranca em escala para uma vela de 6m2.



Vista lateral do barco numa situação de orça. Os comprimentos previstos do leme e da bolina foram aumentados em relação aos usados no modelo. É mais fácil cortá-los, se necessário, do que ter que laminar outros maiores.


quinta-feira, 5 de julho de 2007

Verificação Estrutural do Fundo

No caso do fundo, que é o painel de menor rigidez, plano na direção transversal ao barco, a preocupação maior é de alguém meter o pé através do fundo. Esta verificação só será feita para o barco na água. Se alguém pisar no fundo do barco em seco, merecerá ficar com um casco furado.

Observando-se os valores das cargas por unidade de comprimento de barco, indicadas nas tabelas de cálculo dos esforços e tensões, verifica-se que o valor da carga quase sempre está acima de 1kgf/cm. Se desprezarmos as seções próximas dos diafragmas tranversais (espelho de popa, banco e antepara do mastro), que terão uma ajuda extra destes mesmos diafragmas, podemos definir o valor de 0,6kg/cm como um limite mínimo razoável para o empuxo da água no fundo, nas regiões em que a chapa do fundo trabalha praticamente apenas na direção transversal.

Com o mesmo critério, podemos definir que o vão de 66cm entre as anteparas longitudinais de bombordo e boreste é um valor razoável para cálculo da flexão do fundo, considerando-se apenas a rigidez transversal.

Considerando uma faixa de 1cm de chapa, temos, para o empuxo:

q = -0,6 / 66 = -0,0091kgf/cm2
V = -0,6 / 2 = -0,3kgf/cm
M = -0,0091 x 66 x 66 / 8 = -4,95kgf.cm/cm

Admitindo a carga de um tripulante, no centro do vão, distribuida numa área de 30cm x 30cm e supondo que a faixa resistente mobilizada pela carga parcialmente distribuída seja da ordem de grandeza do vão, temos:

q = 75 / (30 x 66) = 0,038kgf/cm2
V = 0,038 x 30 / 2 = 0,57kgf/cm
M = 0,57 x 33 - 0,038 x 15 x 15 / 2 = 14,49kgf.cm/cm


Resistência à Flexão:

Mr = Fi.Mp.bp, onde:

Fi = 0,95
Mp = mp (KD.KS.KT.KF)
KD = fator de duração de carga (para cargas normais, KD=1; para cargas dinâmicas, KD=1,15)
KS = fator de condições de serviço. (em ambiente molhado, KS=0,8; em ambiente seco, KS=1)
KT = fator de tratamento da madeira (considerado 1)
KF = fator para fundações de madeira (ignorado)
mp = resistência característica à flexão em N.m/m
bp = largura do painel de compensado

substituindo os valores, temos:

1,5 (14,49 - 4,95) kgfcm= 0,95 x mpmin (1 x 0,8 x 1 ) x 1cm
mpmin = 18,8kgfcm/cm = 185Nmm/mm

O valor tabelado de mp, para compensado de 7,5mm, fletido na direção das fibras é de 160Nmm/mm para chapas feitas de Canadian Softwood e de 180Nmm/mm, no caso de chapas de Douglas Fir. Nos dois casos os limites ficam ligeiramente abaixo do necessário.

No entanto, se a carga do tripulante de pé no fundo for considerada carga de curta duração (KD = 1,15), o valor de mpmin cai para os 161Nmm/mm. Se a chapa do fundo for revestida com epoxi, o que é uma grande idéia, pode-se considerar que a madeira permanece seca para sempre. Neste caso, o valor de mpmin seria reduzido para 148Nmm/mm, desprezado o aumento de resistência da chapa.


Cisalhamento transversal à placa:

A situação mais desfavorável deve ser quando a pessoa estiver de pé próximo ao bordo apoiado do painel. Considerando a mesma área de 30cm x 30cm, teríamos, por cm de placa na direção paralela ao apoio, admitindo-se um espraiamento a 45 graus, com a carga se distribuindo numa faixa de 30 + 2 x 15 = 60cm:

V = 75 (1 - 15/66) / 60 = 0,97kgf/cm

Vrp = Fi.Vpb.bp, onde:

Fi = 0,95
Vpb = vpb (KD.KS.KT.KF)
vpb = resistência característica ao cisalhamento transversal à placa (N/mm)

substituindo:

1,5 (0,97 - 0,3) = 0,95 x vpbmin (1 x 0,8 x 1) x 1cm
vpbmin = 1,31kgf/cm = 1,29N/mm

O valor tabelado de vpb para o compensado considerado, com 7,5mm de espessura é de 3,7N/mm, no caso das fibras das folhas da face estarem ao longo do vão e de 1,2N/mm, se a fibras estiverem dispostas transversalmente ao vão. Se as fibras da placa estiverem na direção transversal ao eixo do barco, a condição estará atendida.


Conclusões:

A espessura ideal para o fundo seria de 8mm, que não sei se é facilmente encontrada no mercado brasileiro. Adotar 10mm de espessura resolveria o problema mas à custa de um aumento de peso considerável. A situação do cisalhamento máximo não é crítica. O que exigiria maior espessura seria o dimensionamento à flexão. Optamos pelo emprego de chapa de 6mm com os seguintes cuidados:

  • revestimento de proteção do fundo com impregnação e pintura à base de epoxi interna e externa.
  • disposição das fibras da madeira da face externa transversalmente ao eixo longitudinal do barco.
  • utilização de duas nervuras longitudinais internas ou externas (quilhas) para enrijecer o fundo do barco.